Beleza
Beleza?
De 24 de janeiro a 29 de março de 2015
Centro Cultural São Paulo
Rua Vergueiro, 1000, São Paulo, SP, Brasil
Artistas
Kader Attia, (França), Francis Alÿs (Bélgica/México), Darío Escobar (Guatemala), Alberto Baraya (Colômbia), Albano Afonso (Brasil), Matías Duville (Argentina), Patrick Hamilton (Chile), Carlos Garaicoa (Cuba), Cinthia Marcelle e Tiago Mata Machado (Brasil), Moris (México), Pedro Alonso & Hugo Palmarola (Chile), Sandra Cinto (Brasil), Santiago Sierra (Espanha).
Curadoria
Pamela Prado
ENTREVISTA COM A CURADORA
- Como foi o processo de inspiração para realização da mostra?
Esta é uma mostra em colaboração entre artistas, o Projeto Fidalga, o Centro Cultural São Paulo e eu. O conceito da exposição teve início a partir de algumas obras que me interessavam muito, são temas e preocupações comuns que os artistas abordam de maneiras muito diferentes desde o ponto de vista conceitual e formal, mas que parecem responder ou reagir a certos problemas bem mais transversais aos nossos tempos. Na realidade trata-se de uma pergunta de sorte. A mostra, mais que um objeto concluído, tenta articular esta pergunta.
- Como define a Mostra?
É uma mostra de arte contemporânea internacional, com um grupo de artistas importantes que trabalham com diversos meios. Não busca ter um conceito totalizante que conecte as obras. Mas a obras apontam indícios de inquietude sobre o presente e o futuro da sociedade, da cultura, das cidades, e da natureza.
- Qual o foco?
Em distintos formatos e estratégias, dão visibilidade e reagem às transformações e contradições próprias do desgaste dos sistemas políticos e econômicos que se chocam contra as pessoas (e suas relações sociais), as paisagens (e as definicões territoriais), e os países (e suas demarcações geopolíticas
- Por que tem esse nome?
Beleza? - com sinal de interrogação – é uma expressão brasileira que pergunta se por acaso tudo está bem. Assim, parece relançar a beleza – conceito extinto no discurso da arte – para outro lado, para o da preocupação dos artistas com o estado do mundo contemporâneo, a globalização e a crise do modelo econômico imperante. Beleza? reúne obras que parecem formular esta mesma pergunta: está tudo bem?
- Quantas obras estarão presentes?
São 13 artistas com 13 projetos de obra em diversos meios, desenhos, vídeo, fotografia, instalação, escultura.
Artistas: Kader Attia, Francis Alÿs, Darío Escobar, Alberto Baraya, Albano Afonso, Matías Duville, Patrick Hamilton, Carlos Garaicoa, Cinthia Marcelle e Tiago Mata Machado, Moris, Pedro Alonso & Hugo Palmarola, Sandra Cinto, Santiago Sierra.
- Quais são essas contradições que pretendem trazer?
Beleza? não propõe vincular estas obras em torno da fantasia tranquilizadora de um conceito unificador que as conecte. Pretende, ao contrário, apresentar o oposto desta unificação totalizante: uma diáspora de reações – ou resistências – aos processos de transformação próprios do capitalismo tardio e da política transnacional, e seus efeitos sobre a vida. Considerados, em seu conjunto, como versões diversas de uma mesma pergunta, Beleza? está a meio caminho entre o futuro incerto destas transformações, e o passado que as tornou possíveis. Beleza? neste sentido, como expressão verbal e como exposição, sabe da impossibilidade do belo, e em seu ceticismo, o reconsidera, ao formular a beleza em forma de pergunta.
Albano Afonso adianta esta pregunta do lugar da representação de uma selva idílica, proposta talvez como denúncia daquele ponto de origem, no qual não há retorno, ou de uma natureza recriada, artificial e manipulada pelo homem como no trabalho de Alberto Baraya, até chegar a intervenção direta da transformação tangível do território em ‘Cuando la fe mueve montañas’ de Francis Alÿs. A devastação de territórios, e sua definição geopolítica, é tomada por Santiago Sierra na forma de porcos devorando a península Helênica, mostrando a alienação e a exploração, a desigualdade e o problema da distribuição da riqueza, manifestando a natureza perversa do dinheiro, e a discriminação racial em um mundo em tempos de mudança, dominado por fluxos migratórios unidirecionais. Assim mesmo, como os porcos devoram a cartografia, Kader Attia oferece uma imagem distinta a desintegração contemporânea acerca do colapso de abstração no globo. Com ‘Oil & Sugar’, está ali a corrosão do mundo pelo combustível fóssil, responsável direto por guerras e invasões. Neste cenário a pergunta persiste: ‘está tudo bem?’ Matías Duville reage propondo a arte como uma força geradora, capaz de criar um planeta similar a este, supostamente diante de evidências da desaparição do próprio. O trabalho de Moris também reconhece o estado mutante dos territórios e das paisagens, sobretudo a nova paisagem urbana, produto das dinâmicas de obsolescência e desmando, impulsionada por um sistema econômico baseado na permanente produtividade. Se representa as culturas marginais dentro de um contexto de relações desiguais de poder e acesso, as mesmas como no caso cubano exposto por Carlos Garaicoa, que incorporam a cidade e sua decadência, contradições, memória, e a rua, como representação última da memória individual e coletiva. Numa medida de que nem tudo está bem, Cinthia Marcelle e Tiago Mata Machado elaboram o protesto como reação a estes processos, transformando o trabalho também em um tipo de paisagem e a necessidade de imaginação de novas estratégias políticas para romper o ponto morto da democracia atual. E Sandra Cinto discute por outro lado a necessidade de silêncio e pausa em uma sociedade cheia de ruídos e informação. O que está em jogo definitivamente é o tipo de objeto que define o estado atual das coisas, que tipo de objetos são os novos componentes desta paisagem, deste território, das cidades, da cultura. No trabalho de Darío Escobar, estes objetos são os novos símbolos da história e religião da Guatemala, aqueles que verdadeiramente dominam a cultura visual hoje em dia, objetos produzidos em massa, como skates, bolas de futebol, tacos de basebol, símbolos que se convertem em algo sagrado, ou dessacralizado. Estes novos territórios são o resultado de conflitos e de histórias, e da transformação de narrativas em objetos, que encarnam processos traumáticos nas pessoas, nas paisagens e nos países, como está posto no trabalho de Alonso e Palmarola, que resume essa observação em um sistema de pré-fabricação da construção civil, cujas trajetórias são parte integral da paisagem política do século 20, e que na obra de Patrick Hamilton materializam-se em um mecanismo de motor de trator, o horror das disputas políticas e ideológicas que uma e outra vez nos forçam a ensaiar a pergunta: Beleza?
Pamela Prado
Curadora em residência no Projeto Fidalga
MA Curating Royal College of Art